domingo, 22 de setembro de 2013

As canções que você dançou pra mim por Angela Spiazzi



TEATRO DE CÂMARA TÚLIO PIVA - Rua da República, 575, são aproximadamente 21h30min. Uma longa fila me espera, o público aguarda tranquilamente a hora de sentar-se frente ao espetáculo que cuidadosamente escolheu. Discretamente observo-as, pois me chama a atenção o número de casais, de idades variadas, mas as cabeças grisalhas são a maioria. Curioso...
Não. Os motivos pelos quais estamos ali, são distintos.
Eu como bailarina, e alguns outros mais, fomos para assistir a Focus Cia de Dança. Criada em 1996, que têm em seu currículo prêmios e aclamadas apresentações na Alemanha, Panamá e 32 cidades da França do seu espetáculo As canções que você dançou pra mim eleito pelo jornal O Globo em 2011, como um dos 10 melhores espetáculos da dança.  
E outros tantos para ouvir e sentir a música de Roberto Carlos que marca o imaginário brasileiro desde a década de 1960 com aquelas jovens tardes de domingo da Jovem Guarda.
Em cena, quatro casais são embalados por um grande pout-pourri com 72 canções interpretadas por ele, cantor e compositor, carinhosamente reverenciado como Rei.
Então, não poderia ser diferente.
As portas se abrem. Cena aberta, oito cadeiras dispostas equidistantes. Uma tênue luz azul.
Toca o terceiro sinal, os corações estão a palpitar, dá pra sentir. Entram os bailarinos aos sons dos seus sapatos, blackout.
Suspensão...
Luz e...
“Quando eu estou aqui, eu vivo este momento lindo”.
Sentados, sincronizados e tecnicamente impecáveis fazem um jogo entre o romantismo do Rei, e movimentos quebrados por vezes contundentes e velozes desta Cia contemporânea.
Por um instante... Lembrei-me das reuniões dançantes. Aquelas de garagem. As cadeiras, os tipos, as roupas. Sim há um cuidado. Figurino e cabelos cuidadosamente estruturados. Da época, sem ser antigo. Corpos esculturais.
Nada é por acaso nem há descaso. Eles às vezes são literais. Por que não? Às vezes é preciso. 
Fazer o que as palavras... O são. Simples.
Sim, há um momento em que as músicas atordoam, pois algumas são apenas frases, que por vezes parecem (digo parecem) perdidas, E então...
“Eu te proponho nós nos amarmos, nos entregarmos”.
Onde a coreografia é sustentada por um beijo sem fim. Adoravelmente incrível. Aos olhos parece tão fácil e ao coração mais ainda. A técnica apurada, e o aperfeiçoamento físico aparecem em cada momento. São impecáveis e belos. Sim, belos bailarinos. A dança continua e agora não há mais pra onde ir. Tudo já foi feito.
Então cantam pra nós.
“Olha você tem todas as coisas, que um dia eu sonhei pra mim.”
Como o Rei, eles jogam suas rosas ao público, mas de um jeitinho um pouco diferente.
Vêm a nós. Perguntam sobre amor e paixão. E...
“Ahhh eu vim aqui amor, só pra me despedir e as últimas palavras desse nosso amor, você vai ter que ouvir”.
Ao retornarem ao palco, fazem um passeio às diferentes fases do Rei. Brincam, pulam e sorriem.
O fim está próximo, o desafio de usar 72 músicas em um espetáculo com 55 minutos terá êxito. A plateia está emocionada, há choro, risos e amor.
Com um bonito pas de deux (coreografia dançada por um par) o espetáculo encerra ao som de...
“... não adianta nem tentar me esquecer, por muito tempo em sua vida eu vou viver...”
Cuidadoso e perspicaz. É o que posso dizer da direção e coreografia de Alex Neoral. Nada de espantoso, nem espetacular. Simples. Sacada de mestre, compreender e seguir o Rei.  Apenas isso.
 “...Se chorei ou se sorri o importante é que emoções eu vivi...”
Aliás, Porto Alegre em Cena. É isso, emoções. O Festival comemora 20 anos. Que batalha, que trabalheira, que teimosia, que vontade de querer fazer, de que a cidade cresça, de que o mundo mude, de mostrar que tudo é possível.
Cada espetáculo, cada intervenção, cada contato pode transformar o jeito de olhar, de perceber ou encarar a vida. Pois se algo em nós muda... Tudo envolta também mudará. Então... Que venham, mais e mais Porto Alegres em Cena.
 
* Angela Spiazzi é bailarina da Cia. Terpsí Teatro de dança.

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