domingo, 9 de setembro de 2012

Ballet National de Marseille por Angela Spiazzi

Ah! Porto Alegre Em Cena, viva! Estabelecido no calendário da cidade, da classe artística e do público que adora arte.
Quem curte, programa-se para entrar nesse clima. Clima de Festival Internacional de Artes Cênicas. Que significa isso? Para muitos é a oportunidade de ver e estar perto do trabalho daqueles aos quais admira ou idealiza. E para outros a chance de assistir o que comove ou estarrece o público e a crítica, local, nacional e internacional. Nestes dias a cidade movimenta-se de um jeito muito especial. Até nós parecemos turistas dentro da nossa própria casa. Há euforia, um cheiro diferente no ar. E a certeza de momentos inesquecíveis. Tal como ter o privilégio de assistir ao Ballet National de Marseille.
A companhia fundada em 1972 por Roland Petit vem a Porto Alegre com um programa duplo, proporcionando ao público uma aula de técnica e versatilidade.
Primeiro, o jovem coreógrafo Emanuel Gat com sua montagem: Organizing Demons que coloca cinco bailarinos em cena, sem cenário, em um único e imóvel corredor de luz.
Os corpos o perpassam, entram e saem deste trilho de luz, velando momentaneamente a movimentação, que é intensa e precisa. Passam pelo ar e pelo chão como se não houvesse a menor distinção entre os níveis. Corpos dispostos e atentos.
Diagonais traçadas com precisão geométrica e sem o menor esforço, transformando o vasto palco em uma caixinha, assim... pequenina. E como se já não bastassem os desafios...a música. Densa, ora com acordes dissonantes, ora soando como o tic-tac de um relógio. Tornava-se quase tangível.
Incansáveis!
Estamos em um tempo onde já se dialogou, desconstruiu e se reinventou praticamente tudo. Difícil criar sem esbarrar nos velhos clichês. Para uma coreografia concebida em 2012, Gat não consegue escapar. Mas este jovem sabe o que faz, tem maestria em sua métrica. Sabe como articular os corpos e conduz a cena sem desleixo. Não corre riscos, o que me surpreende, pois se espera, do novo, ao menos uma pitada de ousadia. Mas podem estar certos, ainda ouviremos muitos elogios e reverências a este emergente e talentoso coreógrafo.
Para encerrar o programa, a experiente Lucinda Childs, com seu Tempo Vicino. Nesta, a estrutura da música de John Adams é o que rege a movimentação de quatro casais. A precisão dos movimentos de linhas clássica e o Neoclássico desenham a relação entre tempo e espaço. O figurino em vermelho contrasta com a caixa toda branca. Métrica apurada e sincronismo impecável, os bailarinos entram e saem de cena, como em um jogo: ora este, ora aquele e agora estes aqui. A atmosfera é leve e serena. Suave como um flutuar.
Belos!
A Companhia, hoje com 40 anos, tem uma história a contar, busca jovens talentos e não deixa aqueles que a tornaram um dos expoentes da dança contemporânea europeia para trás. Lucinda Childs é uma delas. Coreógrafa e performer desde 1963, traz em seu currículo nomes como Bob Wilson e Phillip Glass. Tem prêmios e distinções de notável relevância em sua bela trajetória. Infelizmente nã oencontrei a data de criação da coreografia. Mas observa-se nela a dança ainda codificada e construída conforme o dito por seus grandes mestres clássicos. Tudo certo, limpo e claro. Com um cândido sorriso no rosto.
É de se louvar uma Companhia que resista tão bem ao tempo, que tenha em seu cast dentro e fora da cena jovens ávidos de dança. Carregados de vida e com sede de experiência. Isso é que faz o grupo mover. Comover. Vida longa aos que lutam e não envelhecem. 
Mais um espetáculo.
Mais uma noite de dança no Porto Alegre Em Cena.
E que venham outras e outras e mais outras.
Muito obrigada!

*Angela Spiazzi é assistente de direção e bailarina da Cia Terpsí-Teatro de Dança

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