sábado, 18 de setembro de 2010

Rochele Porto: Happy days



Happy days

Antes de discorrer sobre o que vi no dia 11 de setembro no Theatro São Pedro, gostaria de esclarecer alguns fatores. Primeiramente, quero deixar claro de onde estou falando. Pois, sou uma pesquisadora da área de artes cênicas, mas não alguém que se especializou na difícil tarefa de fazer crítica teatral. Portanto, o panorama dado será o de um pesquisador que tenta observar o contexto e a si mesmo, enquanto observador e que, assim, constrói uma realidade.

Vou começar, então, falando sobre o momento pré-peça. Como só consegui assistir a Happy days no último dia, ouvi vários comentários sobre o espetáculo. E, claro, eles não só me influenciaram como me deixaram muito curiosa, porque todos eles, se não tinham um tom irônico, tinham uma afirmação bastante convicta dizendo: “muito chato!”, “aquela mulher é muito ruim!”, “aquele que o Peter Brook trouxe foi bem melhor”. Outros um tanto medrosos, pois eram pessoas de outras áreas que, tentando “entender” a peça, diziam: “vai ver que o objetivo é ser chato assim mesmo!”. Alguns colegas meus da área teatral, que trabalham com a dramaturgia de Beckett, saíram no intervalo. Um colega que hospedei, que veio de Curitiba, especialmente para ver Bob Wilson, chegou mais cedo em casa, porque não tinha forças para agüentar o segundo ato. Enfim, creio que se possa imaginar que, de alguma forma, fui ao teatro afetada por estas opiniões.

Ao chegar ao Theatro São Pedro, me sentei no camarote do terceiro andar, o que foi bom, pois fiquei de frente para o letreiro. Digo isto, porque quando a peça começou, olhei para baixo e vi as pessoas com pescoços espichados para cima tentando ler a tradução. Imagino que elas tiveram alguns obstáculos para ver a peça.

O espetáculo começa, me encanto com o som e o vento que balançam o pano branco que cobre toda a frente do palco. Era como se caísse um tormenta, um vendaval. Angustiante. Uma mulher sai de dentro de um buraco e da suas primeiras falas. Dou risada e penso: é Beckett. Prendo-me ao texto e em alguns efeitos provocados pelos sons. Como também no ator que surge de costas fazendo alguns gestos. No entanto, ao longo da peça, vou me atendo apenas ao texto. Tentando “entender”, o texto. Vejo-me, então, num ambiente parecido com o acadêmico.

Era tudo que eu não procurava. Canso-me. Dou algumas piscadas, pois meus olhos quase fecham. Intervalo. Não vou embora. Penso: “tudo bem dormir, aconteceu isso no Quartett e também já ouvi outras pessoas falarem o mesmo, mas, eu não ter nenhum encanto, além de ficar alerta ao texto... Isso é estranho...” Volto ao espetáculo. Adormeço completamente. Surge o som de um raio e ele cai em neon sobre o palco. Acordo. Contemplo encantada, mas, na hora do raio em neon ir embora, vejo as cordas que o levantam. Desencanto-me. Creio que não era a proposta mostrar o processo. Continuo atenta. O homem sai da “toca” e aparece para nós. Penso: “não precisava”. Uma dramaticidade que não precisava. Ascendem-se as luzes, bato algumas palmas e vou embora. E nada mais.

*

Rochele Resende Porto é Bacharel em Artes Cênicas pela Faculdade de Artes do Paraná e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Desenvolve uma pesquisa teórico-prática intitulada Para além do ensaio: a meditação tibetana em um processo de criação.

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