quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Camilo de Lélis #4: In on it


Foto: Guilherme Santos / PMPA

In on it: Mas… Enfim, é uma boa comédia!

Bem recomendada pela crítica e pelos vários prêmios que recebeu, a peça In on it não decepcionou as expectativas e, com o calor que atores experientes sabem levar ao termômetro de uma casa cheia, tudo funcionou bem. Pode-se, inclusive, fumar no palco e jogar a bituca no tablado do vetusto Theatro São Pedro? Por que não? Enfim... Se faz parte da peça...

Mas vejamos a frio. Dois atores representam dois amantes homossexuais. Um deles é autor de teatro e os dois se revezam para dar vida aos personagens de um melodrama com doenças incuráveis, traições conjugais e meninos que sofrem com a ausência do pai. Nesta peça dentro da peça, o que surge é uma sucessão de estereótipos, não faltando o velho com Parkinson, Alzeimer ou algo assim, com amnésia e língua de fora. O jogo de representar a tal peça é entremeado pelos conflitos amorosos do casal gay que, nesta montagem, são tão superficiais que só servem para criar situações cômicas. E é nisso que In on it funciona bem.

A peça convence pelo terceiro ponto de vista, a comédia interativa, ou seja, a moldura do show. Os atores (os reais), desde o início, deixam clara a convenção de que haverá interação com o público, pois falam diretamente com as pessoas e, na sequência, até descem à plateia. Li comentários elogiosos que falam de uma suposta profundidade de sentimentos no espetáculo quando não há nenhuma, pois sua estrutura fragmentada não permite. A peça é uma comédia que alterna show de auditório com um entrecho de duplo enredo, cheio de gags e de bordões.

Não conheço o texto original do dramaturgo canadense Daniel MacIvor, mas o que aparece na montagem brasileira é um melodrama dentro de um drama que está dentro de uma comédia carioca, o que, para mim, resultou numa gozação em três níveis. A dupla de atores, Emílio de Mello e Fernando Eiras, são intérpretes que dão conta do cômico, equilibrando perfeitamente os dois clowns, o alegre e o depressivo. Eles têm domínio absoluto da brincadeira, e a direção de Enrique Diaz soube valorizá-los, apoiando a encenação em seu carismático desempenho. O público riu bastante e aplaudiu de pé a performance dos atores. Pelo resultado alcançado, a comédia In on it ficará bem dentro da memória do 17º Poa em Cena.

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Texto: Daniel MacIvor / Tradução: Daniele Ávila / Direção: Enrique Diaz / Assistente de direção: Pedro Freire / Direção de cena: Marcos Lesqueves / Coreografia: Mabel Tude / Consultoria de movimento: Marcia Rubin / Técnica Alexander: Valéria Campos / Elenco: Emilio de Mello e Fernando Eiras / Figurino: Luciana Cardoso / Cenário: Domingos de Alcântara / Iluminação: Maneco Quinderé / Trilha sonora: Lucas Marcier / Produção: Enrique Diaz / Duração: 1h20min / Classificação: 16 anos


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Camilo de Lélis, diretor de teatro, entre seus trabalhos destacam-se: O ferreiro e a morte, Macário, o afortunado, O estranho Senhor Paulo, A bota e sua meia e Mehrda, presidentas que foram agraciados com o Troféu Açorianos da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre em várias categorias. Seus trabalhos foram vistos em circulação por quase todo Brasil. No exterior, destacam-se as apresentações de Jacobina e de Mehrda, presidentas em Montevidéu (em 1996 e em 2001, respectivamente) e de O estranho Senhor Paulo em Buenos Aires (1997). A bota e sua meia apresentou-se na Alemanha, em 1998, e em Portugal, em 2003, dentro do Projeto Cena Lusófona. Em 2006, as encenações de Camilo de Lélis foram objeto da monografia Carnaval, encenação e teatro gaúcho, premiada no Concurso Nacional de Monografias Gerd Bornheim. A obra foi publicada em 2007, registrando em livro a contribuição desse encenador para o teatro.

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