quinta-feira, 10 de junho de 2010

Solo Brumas

“Nascido vivo é a expulsão ou extração completa do corpo da mãe independentemente da duração da gestação de um produto da concepção que, depois de feita a separação, respire ou dê qualquer outro sinal de vida, tal como batidos de coração, pulsações do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos músicos de contração voluntária, tanto tendo sido já cortado o cordão umbilical ou esteja ou não desprendida a placenta. Cada produto de um nascimento que reúna essas condições se considera como um nascido vivo.”

Essa é a definição de recém-nascido da Organização Mundial da Saúde que recebeu, em 2004, na Argentina, um acréscimo. “Deverá pesar mais de 500 gramas.”

A situação: por dia, em Tucumán, morrem 25 crianças diariamente. O acréscimo na definição da OMS reduz o número, melhora a estatística. Mas não resolve as mortes.

Esse é o material com que lida o ator e dramaturgo Eduardo “Tato” Pavlovsky no espetáculo “Solo Brumas”. O cotidiano e sua monstruosidade. A natureza terrível que se esconde no costume, na prática, no dia a dia da rotina. O cotidiano que banaliza, que causa sutis e irremediáveis situações. Aquilo que, de tão perto, torna-se difícil de alcançar. Universo esse de indiferença que tem sido investigado pelo artista argetino desde “El señor Galindez" e "Telarañas" na década de ’70.

Nascido em 1933, Pavlovsky é o fundador do psicodrama na Argentina. O espetáculo marca o seu compromentimento com um teatro que só tem um sentido, o de nos empurrar para transcender nossa visão estereotipada, nossos sentimentos convencionais, nossos hábitos, nossos juízos, provenientes de uma moral impostora, não pela simples questão de destruir tudo isso, mas principalmente para que possamos experimentar o real, e prescindir nossas cotidianas fugas, nossos cotidianos fingimentos, em um estado de total desvalimento, tirar-nos os véus , dar-nos, descobrir a nós mesmos.

A direção é assinada por Norman Briski, artista que, em importância nacional, pode ser comparado a Augusto Boal. Seu trabalho, voltado para o estudo do repertório clássico traz uma direção firme e uma concepção amarrada para o texto escrito em 2009. Briski e Pavlovsky foram militantes contra a ditadura argentina. Hoje, militam em favor de um teatro vivo, que se faz vivo sempre e não se cansa de aproveitar o dia em que o palco é iluminado para respirar.

Respiração essa que é um direito de quem tem menos de 500 gramas.

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Ficha Técnica:

Texto: Eduardo Pavlovsky
Direção: Norman Briski

Elenco: Mirta Bogdasarian, Susy Evans, Eduardo Misch e Eduardo Pavlovsky

Voz em Off: Marcelo D’Andrea
Figurino: María Claudia Curetti
Cenografia: Bea Blackhall
Desenho de Luz: Norman Briski
Desenho de Som: Martín Pavlovsky
Técnico de Gravação: Miguel Gentile
Assistência de Cenografia: Fabia Battauz, Maria Pia Molina Brescia
Assistência Técnica: Andrés Bailot
Assistência de Direção: Eliana Wassermann
Coreografia: Silvia Laguna

Duração: 1h15

Classificação: 14 anos

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